quinta-feira, 9 de julho de 2009

A viagem de volta

Estou no avião saído de Delhi a caminho de Londres. Uma maratona de horas no ar, entre uma eternidade de horas nos chãos desconfortáveis dos aeroportos.

Como sempre medito.

A minha consciência está em ebulição. Estar sozinho no fim de tanta existência submerge-me nos abismos do ser. Tento assimilar algo destes dois últimos meses tão férteis. Tento assimilar as vertigens das últimas horas, do último dia, tão absurdamente esmagador, onde das coisas que vim a procura e conheci se precipitaram sobre si mesmas num orgasmo que não é de prazer, mas simplesmente de intensidade. Medito e escrevo como sempre, tentando entender-me e esvair-me. Mas ainda nada está enxuto.

Nos filmes que passam no avião procuro distrair-me mas abato-me ainda mais sobre a minha própria erupção. Uma história é óptima, e brilhantemente interpretada pelos geniais Merly Streep e Phillip Seymour. Tão boa que me faz voltar a filosofia. A outra história é um filme que não poderia desculpar nem mesmo ao Woody Allen. É com certeza dos piores que vi me anos, ao que não deve ser indiferente o meu estado de espírito. Um argumento e realização patético, que nem o poder hipnótico de quatro dos actores mais belos do mundo poderia salvar. Mas o cenário é a língua, é Espanha. A Espanha idílica de Oviedo e Barcelona em alguma das suas belíssimas Vilas. É Hispânia, e portanto é também Portugal. E Portugal é casa. E de repente, em pleno avião, no fim de três meses da maior e melhor viagem da minha Vida vejo-me forçado a reunir todas as minhas forças para evitar chorar sem controlo. Simplesmente por estar a ir, a voltar, ao berço. A mim mesmo.
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domingo, 29 de março de 2009

De volta...

Há dois dias acabou o segundo Camp: Rama Guitá. Este mini descanso foi bom para relaxar um pouco e preparar a viagem. Em poucos dias estarei de volta a Portugal. E neste momento é mesmo o que desejo.

Concerteza haverá uma próxima vez... Leia o artigo completo CLIC

Mais espirituosos que espirituais!

Nas cidades santas, como é Rishikesh, não se vende alcool em lado algum. Mas há muitos restaurantes hindus que o oferecem discreta e dissimuladamente aos turistas. Aliás, não só restaurantes, mas também outras lojas. No outro dia fui a uma loja dessas que vende todo tipo de bijiganjas tipicas, do genero de colares e pulseiras de rudrakshas, cristais, brincos, etc. Após ter comprado o que queria o fulano que me atendeu perguntou-me se queria “beer”. Como eles têm um sotaque nem sempre facil de discernir, e porque o contexto era tao descontextualizado, eu não percebi. Entao ele levou-me para a parte de dentro e detrás da loja e mostrou-me orgulhoso as latas de um litro de cerveja... No tanks... Eles adoram alccol. Principalmente cerveja e wisky. E claro que isso não é nada. O meu motorista em Delhi ao segundo dia já se ofereceu para me arranjar haxixe e até heroina !!! Enfim, eles arranjam de tudo o que lhes renda alguma comissao. E em geral consideram os ocidentais uns bandalhos que tomam tudo. Muitos deles seguem a mesma linha, e cada vez mais. Outros, a minoria, consideram-nos impuros e em geral não nos respeitam muito. Também, com os exemplos que se vêm por aqui! Além dos ocidentais terem tendencia a vestir-se como hippies, muitos ainda acham que isto faz parte de algum antigo trilho de drogas, e acham imensa piada em vir á procura de “banglassi”, um batido de yogurt com haxixe! Um dos sadhus (renunciantes, homens santos) que tinha vista no Bandara que o ashram onde estou organiza semanalmente, viu-o ontem a vender haxixe a um casal de turistas, em plena rua de Rishikesh! Lindo...
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A ASAE, o comercio e segurança na India


Se a ASAE fosse imcumbida de fiscalizar os estabelecimentos comerciais na India, sob os nossos padroes e regulamentos, o trabalho deles seria simplificado. Cerca de 99% dos estabelicimentos seria pura e simplesmente encerrado. Aliás, para a maioria nem seria preciso entrar no estabelecimento, bastava olhar de fora. E em muitos sitios nem sequer seria necessário verificar estabelecimento a estabelecimento, pois simplesmente fechariam a rua inteira, o bairro inteiro, talvez mesmo a cidade inteira!

Aqui não creio que exista algo equivalente a ASAE. Ou melhor, deve haver, mas so para efeitos de cobrança de impostos, ou provavelmente ainda mais provavel, para cobrança de comissoes corruptas, vulgos subornos. Sim porque o nivel de corrupçao aqui é tao amplo, generalizado e institucionalizado que faria um brasileiro ter orgulho na seriedade dos seus politicos e respectivo sistema. Muito mais um português. Não creio que aqui haja muita mafia. A economia paralela é oficial!

Isto faz-me pensar nos exageros opostos a que chegamos na Europa, onde tudo esta regularizado, normalizado, até a cor, tamanho e formato da fruta e legumes! É ridiculo. Coisas que foram comidas sem problemas por séculos sao de repente proibidas por um senhor de gravata sentado nos corredores de Bruxelas. Tudo para nossa segurança claro! Ou para controlar o negócios de biliões que hoje é a PAC.

O certo é que tenho comido em muitissimos restaurantes, a maioria deles com pior aspecto do que os piores que já comi em Portugal. Nem por isso mais sujos, mas o padrao de aspecto é simplesmente outro. A ASAE fecharia absolutamente todos sem pensar duas vezes. E a verdade é que ainda não tive problema alimentar algum. Nada. Estou inclusivamente convencido que aquele primeiro e único vomito que tive no primeiro dia em Delhi foi psicossomático. Tenho comido e bebido, e tem sido uma optima experiencia, porque aqui os restaurantes são baratissimos (come-se bem por 1, 2 ou 3 euros, e até por menos), e muitos deles têm um menu mais variado que os chineses, posi são destinados a turistas de todo mundo. Assim, têm menu indiano, vegetariano e não vegetariano, e depois menu chinês, italiano, e muitas vezes ainda menu maericano, israelita, continental , arabe... é uma festa!

Não estou com isto a dizer que é melhor não ter normas e regulamentos sanitários e de segurança. Claro que é. Mas nem tanto ao mar, nem tanto a terra. Aqui a maioria dos taxis são triciclos, os famosos rickshaws. Segurança? Z E R O!. A única segurança é andarem geralmente devagar. Mas num triciclo com uma area de um mini podem ir 12 pessoas. Mais condutor. Sem vidros, nem portas, nem airbags! E tem de andar por entre vacas, caes, peoes, outros triciclos, carros, camioes, etc. Todos com uma nocao de conduzir na vi apublica que faria um portuguûes orgulhar-se da sua educaçao e civismo.

E assim a Índia anda. E anda mesmo. Devagar e mal. Mas com tanta gente a andar, no fim andam inevitávelmente muito. Muito mais. Mais uns anos, e se isto não implodir tudo, a ìndia será uma hiperpotencia que só a China olhará de cima...

O mais curioso é que nunca, em nenhum país, e nem mesmo em Portugal, tive a sensaçao de estar num país tao seguro. Não a nivel sanitário ou na estrada, porque nesse aspecto é mesmo desastroso. Mas na sensaçao de estar seguro nas ruas, na sensaçao de que não serei assaltado, ou pior. Não é que não hajam riscos, isto não é pais de santos. Mas por algum motivo é um pais relativamente seguro. Pelo menos para um homem. Para uma mulher, sobretudo se for ocidental, e pior se for loira, as coisas mudam. Os indianos são em geral muito reprimidos sexualmente, e acham que as mulheres estrangeiras em geral são bastante... “dadas”. Assim, se for uma mulher e quiser viajar sozinha na Índia é preciso alguma atençao e espirito tolerante extra, alguma paciencia. Mas mesmo asism nada de especial. Há, ainda há, uma sensaçao de segurança realmente fantástica no ar. Não sei exactamente porquê, a quê devemso esta benece, mas também não importa. Mais vale aproveitar enquanto dura.
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terça-feira, 24 de março de 2009

Sobre a India moderna

Estive a ler mais um livro. Um optimo: White Tiger.

Retive um comentario absolutamente divino para caracterizar a India moderna.

"Antes da indenpendencia a India vivia sob a lei do zoo. Depois da independencia passou a viver sob a lei da selva."
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domingo, 22 de março de 2009

Piadinha de guru...sobre guru!

Durante os sat sangas, ao final do dia, podemos fazer perguntas ao Swami Dayananda sobre o que quiseremos. Ele tenta sempre responder mesmo quando nitidamente acha a pergunta...tonta.

No outro dia fizeram-lhe uma pergunta, daquelas que, mais cedo ou mais tarde, acaba por aparecer sempre: como reconhecer um grande guru?

Ele respondeu como quase sempre, com extremado bom humor.

Dayananda: “Deve-se ter sempre uma fita métrica á mao. Quanto maior for a barba mais grande é o guru!”

Dayananda: “Uma vez o meu professor de gramática (gramatica de sanscrito) estava a voltar na sua bicicleta para o seu ashram, aqui perto. No caminho um taxi parou-o e de lá saiu um individuo que lhe perguntou: Swamiji, qual o maior guru de toda a area de Rishikesh? Resposta do swami: sou eu!”

E entretanto já não para ter piada, mais a sério...

Dayananda: “O guru não tem de ser grande. O que o guru tem é de ajudar o aluno a reconhecer o grande que ele é!”
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Pratica intensiva de yoga. Yoga?!?

Entre os dois Camp's de Vedanta, o anterior e este que estou a fazer, tive quase 20 dias com pouco para fazer. Ainda por cima a maioria dos meus amigos daqui estava de viagem turistica algures pela Índia. Por isso aproveitei para sair do ashram e ir para Laxmanjhula (a ponte mais a norte), mais perto de onde estava a praticar yoga, aproveitando também para fazer uma alimentaçao mais variada e saborosa. Pratiquei intensamente, como nunca antes na minha vida. Em média 4 horas por dia. 4 horas por dia de asana (as tecnicas corporais).

Ashtanga Vinyasa Yoga.

Este metodo é o mais na moda no mundo ocidental actualmente. Resumindo é um metodo inventado por um indiano e aperfeiçoado por outro seu discipulo há cerca de 70 a 50 anos atrás, para dar aulas a crianças e adolescentes de um palacio para o qual foi contratado numa missao meio de professor de yoga meio de educaçao fisica. E é isso que o método é: um metodo que é meio asanas de yoga e outro meio de educaçao fisica. Sao só tecnicas corporais. Eles dizem que tem pranayama (respiratorios) e meditaçao incorporados. Não vou ser obtudo e dizer que não tem. Afinal de contas, queiramos ou não, temos sempre de respirar e se possivel devemos praticar concentrados e conscientes no que estamos a fazer. Também tem bandhas (contraçoes de plexos e glandulas) e drishtis (olhar concentradamente para algum ponto). Mas convenhamos que tudo se passa dentro do asana. Sao as tecnicas corporais que sao o foco. E é por isso que este metodo é tao popular actualmente no ocidente (indianos mesmo a praticar este metodo sao poucos). Consiste em fazer 1 série (ao todo, entetanto, já “codificaram” 6 series) de posiçoes, encadeadas umas nas outras atraves de vinyasas, que na pratica sao variaçoes de surya namaskar (sequencia de posiçoes chamada “saudaçoes ao sol”). Porque o movimento é quase constante e os movimentos devem ser coordenado com a respiraçao chama-se “vinyasa”. E a verdade é que de vinyasa tem muito, agora de ashtanga yoga tem pouco. Ou nada. É asana mesmo. E esse é o ponto forte e fraco deste metodo. Para quem gosta de suar fazendo um trabalho fisico intensivo que mistura força e flexibilidade, através de asana forte e feito com poucas pernanencias (5 a 8 respiraçoes) é o metodo quase perfeito. Para quem quer algo mais...tera de migrar para outro estilo, porque neste, depois de dominar a primeira seria a unica coisa que há é... mais 5 series de crescente exigencia! E no mundo inteiro so há uns 2 ou 3 gajos que supostamente dominaram as 6 series. Aliás, mesmo a primeira já é bastante pesada e suficiente para 90% dos comuns mortais. Este não é o estilo indicado para quem estiver com problemas fisicos. Aliás, só dá para quem estiver razoavelmente bem e quiser ficar ao nivel de artista de circo ou ginasta olimpico. É demasiado intenso, cansativo (extenuante), exigentea nivel de flexibilidade, e sobretudo rápido. Não da para que a pessoa que coloque cuidadosamente na posiçao. Não dá para relaxar e meditar na posiçao. E pelo tipo de pratica tende a ocasionar problemas de joelho e de base de coluna. Se o professor que ministra a aula for como a maioria, que faz ajustes brutais no praticante, “ajudando-o” a colocar-se em posiçoes que a partida o corpo não parece permitir, entao temos um caldinho bastante picante! Mas se o praticante já tiver alguma experiencia e autoconhecimento, souber os seus limites e se souber defender, em geral não há grandes problemas. E, para quem lhe assentar bem, é divertido. E toca a suar. Suar muito. Tanto ou mais que numa sauna! Não estou a exagerar. Só a primeira serie, que sao cerca de 25 asanas com variacoes, mais os vinyasas, dura cerca de 2 horas a fazer, e sua-se abundantemente desde os primeiros 10 minutos!

Para mim, que sou de tendencia kapha, terra, de bases sólidas e com tendencia a ficar (demasiado) estável, tendendo a inerte, este tipo de pratica dinamica assenta-me como uma luva. Ainda mais que eu gosto de suar, este suar de exercicio fisico intenso! Custa-me. Ainda mais porque tenho problemas graves nos joelhos que me limitam em elgumas posiçoes. Mas gosto, acho divertido, entretido. Mesmo se a pratica é tao intensa que não consigo fazê-la todos os dias. Nunca vou ser um “ashtangi”, que aliás é um grupinho de yogis tremendamente vaidoso e geralmente bastante ignorante. Aliás, ainda nem sequer sei se considero isto yoga ou não! Mas que é divertido é. Gosto. Faço como desporto. Já levo 15 praticas e vou fazer mais.
Alguns professores que conheco dizem-me que este estilo de yoga, segundo os principios do ayurveda (a suade segundo os vedas) desiquilibra todos os doshas e todos os sistemas biologicos da pessoa. Dizem tambem que e himsa (agressao) ao proprio organismo... Eu ja estudei um pouco de ayurveda e pretendo estudar mais. Mas por enquanto nao sei fazer este tipo de avaliacoes. Alias, cada vez mais, o que mais me importa e como me sinto. Porque gurus a dizer tudo e mais alguma coisa, assim como o seu contrario, e o que nao falta. Assim, cada vez mais, procuro observar-me e avaliar pro mim mesmo! E tenho-me sentido bem.
Emfim. Tenho praticado com o Kamal, no Tatwa yogashala. É um professor impecável. Não é brutal, não é 100% ortodoxo, e é cuidadoso, atencioso e informal. Deve ter uns 30 anos e de aspecto fisico parece imensamente o Michel Jackson, e algumas colegas de pratica dizem que acham que ele é gay. Não sei. Mas que todos gostamos imenso dele isso gostamos. Ainda lá vou voltar algumas vezes mais. O melhor deste gajo e que ele nao e um "ashtanga teacther" ortodoxo, daqueles que procura ser mais Pattabi Jois que o proprio Patttabi Jois, e que forcam os alunos nas posicoes com verdadeira brutalidade, que muitas vezes acabam com problemas graves de joelhos ou lombar. Este ate usa straps e blocos para ajudar nas posicoes, evitar problemas de joelhos, etc. Ate evita duas ou 3 posicoes da serie para ser cuidadoso, e nao forca ninguem... Embora este nao seja o meu estilo, a verdade e que este professor e excelente. E um bom professor e meio caminho andado. Definitivamente a minha natureza nao e a ortodoxia!

O mais engracado e que , nao tendo nada mais que asana, nao tendo mantra...tem! Como as aulas sao guiadas e a pratica e sempre igual, toda a pratica acaba por ser um mantra, sempre igual, do inicio ao fim. O professor diz exactamente as mesmas coisas, da mesma forma... E o ingles dos indianos costuma ser muito divertido!

Iyengar yoga

Antes da moda do Ashtanga “vinyasa” yoga se instalar um pouco por todo mundo (fora da Índia) a partir da década de 90 do século passado, o estilo mais famoso de praticar Hatha yoga era aquilo que hoje se conhece como “Iyengar yoga”. Iyengar yoga é a forma como o mestre Iyengar e os seus seguidores praticam Hatha yoga, mais propriamente asana! O Iyengar também aprendeu os passos iniciais com o krishnamacharya, o mesmo mestre que inventou originalmente o Ashtanga “vinyasa” Yoga. Mas nunca chegou a ser um praticante ou seguidor desse estilo. Antes praticou essencialmente sozinho, intensamente, durante muito tempo. Aos poucos foi desenvolvendo o seu estilo, conforme os seus gostos e necessidades, bem como os gostos e necessidades dos seus alunos. Um estilo com atençao a problemas de saude, com alguns tiques terapeutico portanto. Mas nem por isso suave. Acabou por se transformar num método quase oposto ao anteriormente referido: parado, estátito, sem nenhum “flow”, um “flow que agora esta tao na moda. E isso não é nenhuma critica, até porque essa (estática) é que é a forma mais classica e ortodoxa de asana.

A certa altura, lá pelos anos 50/60, um famoso violonista travou contacto com ele, gosto do que viu, trouxe-o ao ocidente e incentivou-o a escrever um livro, que viria a ser o famosissimo Light on Yoga, um dos melhores e mais famosos livros de Hatha yoga de toda a história do yoga, e que influenciou grande parte das escolas, professores e praticantes de todo mundo! Esse estilo de Hatha yoga, que hoje tem nome próprio (“Iyengar yoga”), consiste essencialmente em praticar asanas, as tecnicas corporais. Á medida que os ocidentais se tornaram a força predominante nessa pratica o metodo foi-se tornando mais e mais resumido ao fisico. Hoje o metodo é uma refinadissima pratica de tecnicas corporais, que se pratica com imensos acessórios (cordas de parede, blocos, straps, varios tipos de almofadas e cobertores, pesos, etc.). O especial desta pratica, é a atençao ao detalhe, que tem um nome generico de “alinhamento”. A atençao ao detalhe é quase tao estenuante e exagerada como no metodo anterior sao os vinyasas constantes. É incrivel o nivel de detalhes que se devem ter em atençao em posiçoes relativamente simples. Os apoios dos pés sao dissecados ao milimetro. Mas o alinhamento dos quadris consegue ser ainda mais dissecado. O encaixe das pernas nos quadris, o encaixe dos braços e ombros no tronco, a rotaçao dos ombros, dos joelhos, das coxas, os apoios de maos, o alinhamento da cabeça... Sao promenores sem fim!

Fiz um curso intensivo de 10 dias seguidos, 2 horas por dias, com um professor daqui, chamado Suryans. O tipo não é o mas conceituado de Rishikesh. Os mais conceituados sao o Rudra Dev, antigo professor de Hatha yoga do Sivananda Ashram e discipulo senior de Iyengar, que entretanto ganhou ganhou fama e na decada de noventa abriu a sua própria sala para se dedicar a dar aulas nesse estilo. Aos poucos o pranayama desapreceu da pratica e ficou so o asana. A sala dele esta no lado oposto a todo o movimento de Rishikesh, é imunda e está cheia de alunos fervorosos atras do mais famoso professor de “Iyengar” de Rishikesh. A segunda professora mais conceituada é uma velhinha Suiça, chamada Usha Devi. A incrivel história desta mulher pode ser vista a partir deste site. Tal como o professor anterior tens as aulas demasiado cheias. E tal como o anterior prima pelo estilo hiper exigente e militarizado de dar aulas. “Isso está uma merda” é algo que pode ser considerado algo quase atencioso, uma especie de elogio iyengarizado dado pela velhinha, que depois conta uma piadinha e ri para desanuviar. Menos atencioso será por exemplo um pontapé ou uma verdascada para assinalar algo mal executado numa posiçao! Ou simplesmente para obrigar o praticante a lidar com o ego, diz-se...O meu professor, Suryans, ainda que dado a poucos elogios, era de estilo menos militar. Menos, so um pouco menos... E como ainda nao tem tanta fama é menos pretensioso e pode ser mais atencioso. Atencioso demais! Não de simpatia, mas de atençao ao detalhe! Em 10 dias, 2 horas por dia, 20 horas portanto, devemos ter feito, ao todo umas 13 ou 14 posiçoes! Não chegamos a fazer shirshasana (a posiçao sobre a cabeça) e só tentamos um surya namaskar, a saudadçao ao sol. Mas a meio dessa tentativa abortada o gajo disparou logo “ you are not ready. You see, i told you, not ready”. !!! “You can t do shirshasana whith out knowing this, you are not ready you see, i told you, you see”. !!! "You cant do pranayama, you are not ready you see, i told you, you see, not ready”. Ás tantas eu já não sabia se me havia de rir da forma dele falar ingles se do exagero dado aos detalhes e as constantes repetiçoes para voltar a tentar girar ligeiramente o joelho mais para fora, ou a parte de fora do pé mais contra o chao, ou o osso da frente dos quadris mais para cima, ou os ombros mais abertos... Trikonasana, trikonasana, trikonasa, trikonasana... !!! E eu nem sou nada de especial em asana, mas tambem não sou um iniciante. E estavam la alunos antigos de Iyengar, e até professores! Eu, sinceramente, não sabia que poderia haver tanta coisa para ter em atençao numa posiçao, seja ela qual for. E por isso adorei. Adorei porque aprendi. Aprendi muito sobre asana. Sobre detalhes que algumas vezes fazem muita diferença. Detalhes que salvam um joelho, detalhes que mexem realmente com toda a estrutura muscular dos quadris, com o encaixe da coluna, detalhes que têm reflexos importantes quando nos viramos ao contrário num shírshasana, etc. Adorei aprender, e como foi para aprender que cá vim fiquei extremamente satisfeito. Adorei aprender e quero saber mais. Mas isto não se aprende em 10 dias, em 20 horas. Aprende-se em 10 anos, em 2000 horas. Em mais...

Mais uma vez, o único problema deste método, como do anterior, é que é só ásana. Este ainda e mais so asana que o anterior, se e que isso e possivel! Eles bem falam em “open eye meditation”, meditaçao no corpo, “the intelegent body” e blá, blá, bla. Mas convenhamos que isto é asana. Só asana. Asana muito bom, mas apenas e so asana. E se o yoga fica so pelo asana nem yoga é! Yoga é conhecimento. Conhecimento de si mesmo, do Todo, da realidade. E por isso cá estou no Dayananda ashram, a fazer curso de Vedanta, de filosofia própriamente dita. Porque isto de meditar no corpo, ou conhecer-se através do corpo e tal, é uma conversa muito bonita, mas é para quem quer sentir-se bem consigo mesmo por não saber, nem querer saber, mais nada!

Aliás, o meu corpo, depois de 2 semanas a 4 horas pratica fisica intensiva por dia está ressentido. Está cansado, dolorido, retraido. Precisa de descansar para assimilar.
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segunda-feira, 16 de março de 2009

Os rios na Índia e o banho ritual no Ganges


Os rios na Índia não sao apenas cursos de agua. Sao cursos de agua que dao Vida, e por isso tendem a ser divinizados. Nao significa isso que tratem os rios com mais respeito que nós no ocidente. Antes pelo contrário. Com o tempo tudo tende a automatizar-se, radicalizar-se e tornar-se sem sentido. Como os indianos consideram os rios sagrados não se importam muito com a poluiçao que os contamina, porque o caracter sagrado, para eles, tem origem divina e independe das caracteristicas quimicas que uma qualquer analise demonstre! No ocidente, com os novos conhecimentos cientificos e as filosofias naturalistas e ecologistas pelo meio acabamos por respeitar e procurar proteger muito mais os nossos rios que aqui os indianos fazem com os seus. Mas isso é hoje, em que todas as culturas se influenciam mutuamente, se regeneram por fusao, e acabam por aprender e ensinar umas as outras. Mas antes, no passado, os indianos, nomeadamente os hindus, com a sua cultura cheia de deuses, muitos dos quais herdeiros de conceitos e culturas muito antigas, animistas e xamanicas, eles já tinham a sua forma de divinizar os diversos aspectos da natureza, e nomeadamente os rios. Assim, é muito comum que os sitios onde os rios de encontram uns nos outros, ou a foz dos rios, ou sobretudo as suas nascentes sejam considerados lugares sagrados, auspiciosos, lugares de peregrinaçao.

De todos os rios, o mais famoso, o maior da Índa actual, é o Ganjes, ou melhor, a Ganga.

Aqui faço um aparte para contar uma história que uma vez ouvi. As nossas calças de “ganga” devem o seu nome ao Ganga, pois o azul dos jeans seria a cor do Ganga... Não sei se é verdade, mas é possivel.

Aqui em Rishikesh é um lugar especial da Ganga. É o lugar onde o Ganjes deixa os seus desfiladeiros de montanha, e já mais ou menos volumoso deixa-se desfilar pelas enormes planices do sub continente indiano. Logo, aqui é um óptimo lugar de partida para subir rio acima atrás das várias nascentes do Ganges, e nomeadamente do Gangotri, uma nascente directamente nos gelos das montanhas que, um pouco mais longe, já sao os Himalayas. Todas essas nascentes sao lugares sagrados, lugares de peregrinaçao, especialmente para sadhus e yogis, e quase todos eles têm templos e ashrams. Espero um dia poder subir rio acima e descobrir tudo isso pessoalmente.

Entretanto não é preciso grandes peregrinaçoes para tomar um auspicioso banho no Ganges! Aqui em Rishikesh, cidade santa e onde o rio ainda é relativamente limpo e muito bonito, tomar um banho é ritual bastante comum. Se for as 4.30 da manha, no Brahmamurti, quando tudo está mais calmo, é considerado ainda mais auspicioso. Entrar na água gelada é um mini sacrificio, uma forma de honrar a mae ganga, uma outra forma de rezar, orar, purificar-se, gerar bom karma.

Eu não sou hindu. Sou fascinado por alguns aspecto das culturas que aqui abundam, mas não sou hindu. Nem quero ser. E mesmo que quisesse, o facto de não ter educado aqui faz com que algumas coisas não tenham grande sentido para mim. Percebo-as intlectualmente mas não sao do coraçao. Assim, quando alguns conhecidos ocidentais têm a brilhante ideia de se levantarem as 4 da manha para ir tomar um banho ritual ao Ganges eu simplesmente passo. Não consigo entregar-me assim tao facilmente a um ritual ou cultura. Parece-me algo meio histérico, vazio de sentido, uma mini festa, uma colagem, daquelas tatuagens que em poucos dias desaparecem, um querer ser mais papista que o papa, ou neste caso mais hindu que os hindus.

Mas não poderia deixar a Índia sem um banho no Ganges. Ainda mais estando aqui 2 meses ao lado do rio! Aproveitei que esta a ficar cada vez mais calor, aproveitei umas horas de almoço livres, aproveitei uns recantos absolutamente lindos e geralmente tranquilos que o rio tem aqui nalgumas das suas curvas, ainda não tomado pelas contruçoes, pelos ashrams, pelos hoteis, restaurantes e lojas. Entrei, mergulhei, até me deixei dar os 3 mergulhinhos tipicos que um indiano qualquer toma, daqueles meio saloios, de mao a tapar o nariz e os olhos fechados rsrsrsrs. Depois sequi-me ao sol forte enquanto leia mais um livro. Soube mesmo bem.

Mas convenhamos que nem se compara a um banho salgado, de atlantico, numa das belas praias de Portugal. Isso sim é ritual, é purificante. É auspicioso!




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Os animais na Índia. A vaca sagrada e os macacos ladroes


No ocidente, ou pelo menos na Europa, esta Europa cada vez acéptica, os homens e animais vivem separados. Cada vez mais separados. Os homens nos sitios de pessoas, os animais nos sitios de animais. Em geral os animais estao no campo, ou pelo menos em casas e terrenos mais ou menos cerceados fora das cidades. Na Europa cada um tem o seu canto, bem demarcado.

Na Índia não e assim. Ou pelo menos ainda não e assim, porque eles estao rapidamente a evoluir no nosso sentido em todos os aspectos.

Na India os homens e animais vivem mais juntos, mais misturados. Habitam mais ou menos os mesmos sitios, sem grandes restricoes. As vezes competem, outras cooperam, outras ignoram-se, outras acarinham-se mutuamente. Disse-me uma amiga que aqui viveu uns meses, que em hindi, a lingua predominante entre os indianos desta regiao, não existe a palavra correspondente para “privado”. Não sei se é verdade, mas acredito. E pelo que percebo também se aplica aos animais.

Que as vacas sao sagradas já sabia. Toda a gente sabe. Faz parte do folclore. Para eles, para os hindus mais propriamente, a vaca é uma mae, que dá leite, alimenta. Como dá Vida, tornou-se um simbolo de Vida, tornou-se sagrada. E claro, nao fossem hindus, há toda uma mitologia e teologia em volta da Vaca. Não tem quase nada a ver com o nosso actual conceito de ecologia. Tanto é assim que um bufalo, por exemplo, que não difere muito de uma vaca, já não é sagrado, e portanto pode matar-se e comer-se. Também não tem muito a ver com os conceitos, muitas vezes piegas, de vegetarianismo emocional, que muitos ocidentais adoptam e pregam por pena ou compaixao pelos animais. Uma pena e compaixao que muitas vezes não mostram quanto as pessoas. Aliás, um vegetarianismo que muitas vezes é parte de uma filosofia reacionária contra tudo o que é humano. Mesmo os indianos hindus, ao contrário do que eu pensava, não sao quase todos vegetarianos. Muitos sao, mas não sei se chega a ser uma maioria. Sei que muitos, mesmo hindus, comem galinha, porco, peixe. E há zonas da Índia onde esse consumo é generalizado. E até há movimentos ditos modernos, cientificos e racionalistas que fazem campanha para incentivar o consumo de carne, dizendo que a antiga aversao as carnes é um sinal de atraso, uma marca de tempos antigos, preconceitos de religiao que devem ser abandonados! No ocidente invocamos as mais modernas ciencias e filosofias para desestimular o consumo das ditas... Já os muçulmanos, também muito numerosos na Índia, só não comem suínos, porque o consideram o porco nojento. Os chineses, tibetanos e outros comem tudo! Enfim, só a vaca é que é protegida em quase todo lado, nem que seja para evitar confusoes! Não a carne, a vaca! De qualquer forma começam a ver-se currais para guardar as vacas. Não so para elas não andarem no meio das ruas a importunar o transito cad avez mas intenso, mas também para fazer uma exploraçao leiteira mais eficaz, e até porque aos poucos começam a implementar-se algumas leis sanitárias. Embora, diga-se, para um padrao europeu essas supostas leis sanitarias parecem ainda não terem começado a sequer ser conhecidas!

Por mais meses que aqui passe ainda acho curioso ver as vacas a solta por todo lado. Andam, páram e dormem por todas as ruas, escadarias, pontes, becos... Só não apanham boleia dos rickshaws porque soa grandes demais senao... Mesmo assim já vi várias vezes indianos com cabras bebes ao colo num rickshaw! É curioso estar num restaurante e ver uma vaca a entrar com o nariz a ver se lhe calha alguma coisa. Em geral espantam-na sem mais. Mas ainda mais comum é ver a vaca a cagar directamente a porta do restaurante! E mais surreal ainda é ir a travessar uma ponte de pouco mai d e 1,5 de largura, onde peoes e motos se apertam e, lá no meio, está um touro enorme a dormir, como se nao fosse nada...

As vacas nao estao sós nas ruas da Índia. Macacos também há muitos. Algumas pessoas veneram os macacos, sob a forma de Hanuman, o deus macaco, cuja teologia e mitologia também está disponivel na internet. Com os macacos cuidado. Eles vivem alienados do seu papel divino, sao quase tao espertos como um ser humano mas não têm preocupaçoes morais. Uma das forma mais comuns de conseguirem alimento é roubar! Mais propriamente sao especialistas em assaltos. Controlam algumas ruas a partir de uma qualquer arvore, ou os vendedores de frutas desde cima dos telhados e beirais, ou, ainda mais tipico, controlam as entradas e saidas das pontes. Quando alguém é estupido suficiente para levar comida à vista, ou pior ainda na mao, e especialmente se for uma mulher, os ditos macacos simplesmente assaltam o dito cujo. As vezes em grupo, em manobras bem estudadas. As vezes mordem, arranham, guincham! Se não fosse tao real até tinham piada. E tem mesmo...

Também há porcos, por aí, soltos. Vivem com a familia suína, num qualquer beco, numa esquina, numa rua.

Há todo uma outra série de animais, por aí, entre as casas e pessoas, nas cidades como nos campos.

Mas há um animal que, não sei por quê, nao imaginava não Índia. Os caes! Não sei porquê nunca imagino muitos caes em países pobres. Não os comem e não dao leite, por isso para que os querem? Mas querem. Os caes estao presentes em todo mundo, junto aos humanos, e vivem as nossas custas. E não é só porque servm de guardas, ou para a caça. É sobretudo porque fazem companhia, comunicam, sao carinhosos. E na India não é diferente. Claro que aqui os caes não sao de raças apuradas, nem se alimentam de raçoes especializadas, nao tomam vacinas, não vao aos médicos, etc. Os bilioes e bilioes que gastamos no ocidente com os nosso caes de companhia, que na maioria dos casos sao doentes, sobretudo da cabeça, aqui seriam obviamente desviados para alimentar e curar outra especie mais necessitada, os humanos, nem que fosse para oferecer comida a um dos muitos deuses num ritual religioso qualquer. Mas nem por isso os caes aqui tem mal aspecto. Alias, alguns sao bastante bonitos e encorpados. Nesta altura do ano vê-se bastantes cachorrinhos de ninhadas recentes. Não os matam para ficar só com o mais bonitinho. Antes deixam que os mais fortes sobrevivam neste contexto onde a vida de cao não é tao fácil e esquizófrénica como no ocidente.

Uma das coisas que acho mais curiosas é que os animais aqui fazem parte do ciclo de limpeza. Ou de reciclagem. Eles comem quase tudo o que é sobras dos humanos. Sobras e não sobras! As vacas por exemplo comem grande parte dos milhares de cartazes que afixam nas paredes! Não é só pela celulose do papel. É porque a cola sabe a doce! Frequentemente se ouve alguma vaca a tossir, ou a arrotar algo indigesto!

É bonito, é engraçado, não é limpo, mas é curioso...

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terça-feira, 10 de março de 2009

A Índia pode ser viciante.


Momentos de paz...

Não admira que as pessoas se sintam bem por aqui. Isto ainda é relativamente pequeno, tranquilo, seguro e bonito. Pode ser realmente agradável. As pessoas estao de férias, longe das causas de stress e angústia, praticam yoga, fazem umas massagens, conhecem outras pessoas, nem sequer tem de se preocupar muito se estao com uns kilos a mais ou a menos porque as roupas que tendem a usar sao folgadas.... Quem não se sentiria bem assim? Ainda por cima é mais barato estar aqui de férias a praticar yoga, num hotel e a comer em restaurantes do que simplesmente viver a rotina normal em qualquer país da Europa!

Na semana passada mudei-me para um hotelzito chegado à zona de Lakshmanjhula, a segunda ponte, mais a norte. Fica mais perto dos sitios onde estou a fazer aulas de manha e a tarde e é mais divertido, pois é por aqui que ficam a amioria dos turistas. Estava farto do ashram, da comida, dos horarios, dos sinos e mantras que me acordavam todos os dias às 4 da manha! E não se estava a passar lá nada. No fim desta semana volto para lá, para entao retomar os estudos com o segundo Camp, que é o o estudo do Vedanta a partir do texto Rama Guíta.

Daqui a pouco mais de 2 semanas acaba-se a minha primeira viagem a Índia, e aos poucos já estou a ficar com vontade de cá voltar!
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Diversidade na espiritualidade da Índia

Verdade ou verdades?

O que mais gosto na Índia, no “hinduismo”, e em particular no yoga é o facto de não ser uma cultura, e sim muitas. Muitas diferentes, até contraditórias.

No ocidente, e particularmente na Europa, e mais gravemente na Europa mediterranea da qual Portugal é um prolongamento, nós fomos formatados durante muito tempo por uma verdade demasiado... monista. Um Deus, um salvador, uma igreja. Logo, uma verdade. Isso deixou sequelas. As pessoas ficaram formatadas nessa forma de pensamento único, mono. Ficaram marcadas com a ideia de uma verdade absoluta. Uma verdade, só uma, que excluí todas as demais. Com violência se for preciso. Nunca vi as coisas assim. Talvez por que fui exposto desde pequeno a influências muito diversas, talvez porque sou filho de um advogado, e fui estudante de Direito, e por isso sei que a verdade é algo que se discute, que alguém decide, mais ou menos arbitrariamente, por crença, ou por equidade, por interesse... Chamem-me relativista, não me importa. Para mim é quase um elogio. Cada homem tem a sua verdade, em cada momento. E se estamos absolutamente convencidos de algo, entao isso é verdade absoluta, para nós, pois afasta dúvidas e outras possibilidades de verdade. Para nós. Ou seja, a verdade é absoluta não porque seja universal, para todas as pessoas, mas porque é óbvia e evidente para cada um. “A verdade é aquela da qual temos consciência” nas palavras de DeRose. “Tudo está absolutamente certo”, digo eu. Isso para mim sao verdades absolutas.

Voltando ao hinduismo, ás varias culturas que ali co-existem. O facto de haver tanta diversidade cultural chega a ser confuso e dificil para um ocidental que vai a procura de uma verdade ultima e singular. Mas na Índia culturas mais ou menos contraditórias coexistem dentro do próprio hinduismo. E co-existem de uma forma mais ou menos confortável. Porque nao Índia não existe só uma grande igreja dominante, um só papa. O que há sao milhares de seitas cada uma com um ou mais gurus, a maioria delas pequenas, portanto com pouco ou nenhum poder coercivo, e que se vêm obrigados a conviver com as outras 108 seitas e suas verdades. Aqui seita não é algo heretico e perigoso, porque não há um padrao que se imponha como verdade da qual dissidir. Ser diferente é algo comum, e as seitas, desde as micros às um pouco maiores sao a própria estrutura organizacional do hinduismo. Acho isso maravilhoso. Na Índia a verdade revela-se numa grande multiplicidade de formas, e é essa variedade que dá todo aquele colorido que me fascina. Não é uma cultura univoca, antes me abre um oceano de alternativas, possibilidades diferenciadas nas quais me posso perder e reencontrar várias vezes, e em ultimo caso, através das quais me posso perder e encontrar a mim mesmo.

No caso do yoga toda essa diversidade revela-se em todo tipo de pormenores. As praticas recomendadas e realizadas sao do mais diverso, alternativo e até e contraditório. As filosofias que envolvem essas praticas também primam por uma riquíssima variedade. Dentro de uma corrente filosofica há sempre várias correntes discordantes, e sobretudo muitas interpretaçoes diferentes, seja dos textos que lhes servem de fonte, seja na forma de ensiná-los, seja na meta que tudo supostamente tem. Os professores que ensinam (os gurus) sao personalidades dos mais diversos. Há do tipo academico e intlectual e também analfabetos. Há os que vivem numa caverna aos que sao epicentro de um ashram, ou até de todo um movimento religioso, social e politico que move milhoes e milhoes. Desde o que fala muito, ao que permanece em silencio absoluto. Os extremamente bem humorados, e os sisudos e rigidos ao tipo militar. Há os humildes, os que se fazem humildes, e os que não sao humildes, ou pelo menos tentam não se mascarar de humildade! O ambiente natural, cultural e social em que tudo se processa também pode ser diversificadissímo. É muito normal um guru defender que o celibato é a melhor opçao para a evoluçao espiritual, e outro prescrever sexo como parte do caminho espiritual. Um vai exortar uma pratica fisica intensissima que o fará suar abundantemente, outro vai defender que isso é himsa (agressao) e antes deveriamos abandonar todas as praticas fisicas, no seu todo, porque elas vao distrair-nos da contemplaçao do espirito que fica para além das formas. Um professor vai dizer-lhe para concentrar-se no corpo, "open eye meditation frist", outro para sentar-se e cruzar as pernas e simplesmente observar a respiraçao por várias horas por dia, outro vai dizer que é melhor fazer auto estudo enquanto trabalhamos, outro dirá que so meditar no nome de Deus produzirá resultados, outro dirá que tudo isso é demasiado complicado e moroso, é melhor fazer meditaçao instantanea, a meditaçao do riso, "lets fake it until we make it", e outro ainda dirá que qualquer tecnica ou esforço de meditaçao é desnecessário e desaconselhavel porque nós já somos a iluminaçao que procuramos. Mesmo dentro de uma mesma escola de yoga é comum vários professores terem divergência de opinioes, seja quanto à interpretaçao e exposiçao de uma filosofia, seja quanto á execuçao ou ensino de uma técnica, seja quanto à relaçao a estabalecer entre professor e aluno, seja quanto a... tudo! Não é por acaso que dois mestres famosos nunca coincidem no mesmo sitio. Se um discipulo, ou co-discipulo, se destaca invariavelmente sai e vai formar a sua escola, o seu grupo, a sua seita, a sua verdade com mais ou menos variantes quanto a meios e fins. E seja lá qual for o ensinamento todos se dizem perfeitamente defendidos por uma imensidao de textos e gurus, sejam antigos ou modernos. E é muito comum cada guru acrescentarem o seu próprio texto à já muito extensa e rica coleçao que substancia os diversos aspectos do yoga e do hinduismo. Uns sao mais originais e acrescentam algo aparentemente novo, ou reformulado. Outros sao mais comedidos e acrescentam apenas a sua interpretaçao. Seja como for, em todos os lados, gurus e principalmente os seus zelosos seguidores assegurarao que o seu é o único, ou pelo menos o melhor, o verdadeiro caminho para Deus, para a iluminaçao, para a paz e felicidade, e tendem a ficar ansiosos e até beligerantes, ou pelo menos sarcásticos, quando se mencionam pontos de vistas divergentes e concorrentes. Mas é mesmo assim, geralmente não passa disso. Se não gosta dirija-se a outro ashram, a outro guru e pronto. Ou funde o seu...

Tudo isto pode parecer loucura, algo tonto e pitoresco, como se fosse uma espiritualidade sem raizes nem rumo, perdida. Para quem vem a procura de respostas rápidas, certas, confiávíes, para quem tem falta de confiança e procura segurança isto pode ser um inferno. Ou uma soluçao fácil. Mas não é, nem uma coisa nem outra. Para mim é precisamente o ponto forte da Índia, do hinduismo e do yoga é haver várias fontes alternativas, e possibilidades para escolher, para exercer a liberdade, para nos podermos enquadrar conforme as nossas diferenças. É como se a Índia, o hinduismo e o yoga fossem um Uni & verso, que contem a totalidade em si mesmo. Tudo já se especulou, experimentou, e continua a especular-se e experimentar-se continuamente, sem limites.

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Vedismo, nacionalismo e tradiçao na Índia

A Índia e o hinduísmo contemporaneo

Os hindus é um nome genérico para todos aqueles que não sao alguma outra coisa. Mas entre si não têm muita coisa em comum. Ou não tinham. Só os Vedas, e mesmo assim com algumas nuances. Até porque a esmagadora maioria dos hindus nunca leu ou se interessou pelos Vedas, nenhum deles, e não faz ideia do que lá se diz. A maioria da religiosidade popular nem sequer e baseada nso Vedas, e sim de tipo puranico. Aliás, durante muito tempo, até os Brahmanes, que supostamente seriam os defensores dos Vedas, o que fizeram foi sequestra-los, impedindo que mais alguém a eles acedesse. E o mais ridiculo é que até esses mesmo brahmanes muitas vezes esqueceram e ignoraram os Vedas! Decoravam-os, parcialmente, consuante a sub casta, mas nao se pode dizer que conhecessem os ditos Vedas. Mas falemos de hindus, e de Índia...

Desde há cerca de 2000 que esses "hindus" não têm tido régio politico sobre o território agora chamado Índia. Esse poder politico tem sido dominado por budistas, muçulmanos (que dominaram grande parte do sub continente durante 7 séculos) e depois por cristaos de varias naçoes europeias. E o principal motivo que leva os ditos hindus (ou seja, as multiplas seitas que de alguma forma tem consideraçao pelos Vedas, e não sao, objectivamente, um ramo de outra religiao) a não terem tido poder politico consistente por tanto tempo é precisamente porque durante muito tempo não tiveram um minimo uniao religiosa, nem social, nem politica, nem linguistica. Esses hindus têm estado divididos por linguas, crenças e praticas religiosas, seitas, castas, costumes e reinos diversos. O maior feito do “hinduísmo” é a sua sobrevivência. E isso deve-se precisamente a essa mesma diversidade, dispersao e plasticidade, que permite que a cultura se adapte, absorva o choque com outras culturas, incorpore algumas das suas características e assim se já regenerando, por entre passos para trás e para a frente, voltando a recriar-se sempre que tenta voltar ás suas supostas origens. Foi assim com o budismo e o jainismo que de certa forma foram tentativas de restauraçao de uma cultura mais antiga sequestrada pelos brahmanes no periodo clássico. Foi assim com o tantrismo e com o advaita vedanta medievais, que procuraram voltar a uma cultura antiga, liberta tanto dos brahmanes como dos budistas, como dos muçulmanos. E esta a ser assim agora, desde o século XIX, quando o hinduísmo absorveu a influência do imperialismo europeu, nomeadamente britanico, e por isso ganhou orgulho nacionalista.

A regeneraçao em curso, que vem desde os finais do século XIX (primeiramente impulsionada por Dayanand, que renegava o politeismo, o puranismo, o shivaismo, o shaktismo, o shikismo, o cristianismo, etc. em favor de um purismo vedico monoteista) tem, ironicamente, uma forte influência (reacçao e integraçao) tanto dos muçulmanos como dos cristaos imperialistas. Essa influência é a ideia fundamental de unidade. Uniao politica: um país, um Estado, e não variados rei, reinos, donos de terras, etc.. Uniao linguistica, através do hindi e sobretudo do inglês. Uniao social, com a dissoluçao do sistema de castas em favor de uma meritocracia do tipo ocidental. Uniao religiosa, através da dissoluçao e integraçao das crenças e praticas diversas das multiplas seitas, através de uma divulgaçao e popularizaçao dos Vedas e do vedismo, a “religiao dos Vedas” (e não dos brahmanes), uma religiao onde também está a ideia de que só há um Deus, sem forma, e que todos os demais deuses sao meros aspectos desse deus único e sua Criaçao. Esta ideia, hoje mais ou menos generalizada entre os hindus, é relativamente recente, é uma ideia propagada desde o século XIX pelos reformadores modernos do hinduísmo, que procuram criar uma uniao em todos os aspectos da Vida dos hindus. Até a forma de cumprimento tipico dos hindus, que variava de seita para seita, tem sido padronizada através do conhecido namaste (ou do concorrente namaskar), que é uma forma de cumprimento moderna, proposta por Dayanand no século XIX. Esta ideia de uniao é em si mesma politica e religiosa, e visa unir politica e culturalmente os multiplos hindus, dar-lhes orgulho e um sentido de pertença, um sentido de pertença comum. Dayanand, o pai reformador do Vedismo e nacionalismo “arya” moderno (ele preferia arya, nobre, do que hindu, já que hindu é uma classificaçao generica e algo depreciativa feita por estrangeiros) criou um slogan para unir e mobilizar os hindus: “uma religiao (e um só Deus), uma linguagem, uma nacionalidade”. Só assim os “hindus” poderiam deixar de ser submissos politicamente na terra onde sao maioria (e que agora dizem ser a "sua" terra), cerca de 2000 anos depois!

A Índia como existe actualmente, essencialmente hindu, é, portanto, uma (re)construçao recente, onde vedismo e nacionalismo se apoiam e reforçao para (re)criar este novo monismo, a Índia. “Um” país, “uma” cultura, “uma” tradiçao.

Falar de “tradiçao hindu” é algo que deve ser feito com muito cuidado, porque o próprio enunciar do termo tradiçao, neste contexto, tende a levar a enganos...
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domingo, 8 de março de 2009

Uma visita as quedas de água e um guru inesperado...


Um dia juntei-me a um grupinho que ia ver umas quedas de água no monte, aqui a uns poucos Km a norte de Rishikesh. Quando o grupo se juntou finalmente eram um brasileiro e uma brasileira que já conhecia, um casal de lituanos, um holandês e uma holandesa (que não se conheciam), duas japoneses e eu. E um indiano. Todos conheciamos alguém do grupo, mas quase ninguém conhecia sequer metade do grupo todo. Coisas de viajantes.

As quedas de água em si não têm nada de especial. Sao agradáveis, dá para tomar um banho, tem boas vistas e e tal mas...

O que gostei foi de conhecer o indiano, que se chama a si mesmo Vince! Quando o conheci estava no seu quarto, no mesmo local que o meu amigo brasileiro. A música berrava Eminem! Apareceu de estilo rapper de praia ocidental. All Star e tudo. Primeira coisa que fez foi puxar um cigarrinho do seu paquete de Marlboro. Começou logo a fazer de guia, com trejeitos de playboy engatatao pelo meio. Creio que terá entre 25 e 30 anos, não estou certo. Passado uns dias ia para Madrid, Espanha. Tem uma namorada lá. O que vai lá fazer? Dar aulas de yoga claro! Nos primeiros 5 minutos já estava quase a declarar-lhe mentalmente nojo perpetuo, porque eu tenho a mente aberta e tolerante, mas não tanto. Também tenho os meus preconceitos e dou-me todo direito a tê-los. Naturalmente procurei outras companhias. Infelizmente as japonesas não sao muitas boas para conversar, porque como de costume não falavam grande coisa de inglês, e já estou a ser simpático, porque elas também eram. Os brasileiros e holandeses sao mais acessiveis.

Entretanto, lá em cima nas cataratas, enquanto o pessoal se banhava (eu não me misturo neste tipo de banhos publicos, especialmente com a água tao gelada! rssrsrrs), estava eu na conversa sobre yogas e tal com o Vicent (o Holandês) e o Vince ( o indiano) juntou-se a nós. Eis que o gajo se começa a chibar. Afinal era um ex adepto da ISKCON (vulgos “Hare Krishna”), que tinha sido criado dentro da seita (seita aqui não tem sentido pejorativo, pois todos os grupos “espirituais” sao mais ou menos pequenas seitas...) desde muito pequeno. Foi literalmente adoptado e criado pelo grupo. Os “Hare krishna”, para quem não sabe, sao um grupo devocional criado por um indiano emigrado nos EUA, e que tem como base a devoçao a Krishna, o estudo da Bagvad-guita, com o intuito de iluminar o mundo através da consciência de krishna, blá blá blá. Sao um grupo relativamente grandito e presentes em todo mundo. Até na Índia estao! Um dos Beatles foi durante bastante tempo devoto deles, ou pelo menos colaborou com eles, inclusive com doaçao de parte do testamento. Eles ficaram muito famosos (má fama, diga-se) pela forma extravagante como se apresentavam publicamente no ocidente (cabelo rapado e roupas laranjas) cantando pelas ruas o seu famoso mantra: “Hare Krishna”. Pessoalmente simpatizo com eles. Sao opimos no mantra, e tem sempre um restaurante vegetariano aberto e barato em quase todas as principais cidades do mundo. E dao um colorido ás nossas cidades. Colorido cultural também, diversidade. Claro que esta é a minha visao, de quem vê de fora, de quem só vê o colorido e saboreia a culinária sem compromissos. Assim todos estes pequenos grupos “espirituais” de inspiraçao hindu que abundam tanto no oriente como no ocidente sao bastante divertidos.

Quem pertence aos grupos, os adeptos profissionais, os que vivem para esses grupos e os sustêm, acabam por ter sempre outra visao. Porque o grupo (os “espirituais” como qualquer outro tipo) dá, mas também pede. E em geral pede primeiro, e pede mais do que dá. Em geral é preciso ficar bastante tempo e jogar bem dentro dos grupos (mais que competencia é a lealdade canina e a habilidade nas Relaçoes Publicas que conta) para que o saldo comece a reverter. E para a maioria a compensaçao é simplesmente o orgulho e satisfaçao de pertencer e contribuir para a “obra”. E é de obrar que se trata. Essencialmente suster o grupo envolve trabalho, bastante trabalho. Envolve sentido missionário, compromisso, fidelidade, lealdade, idealismo, conviçao, fé, disciplina, entrega, renuncia, etc. Envolve questoes hierarquicas, com os seus abusos e desvios écticos tipicos. Envolve dinheiro. Tende a envolver amizades e amores, e inimizades e desamores. Envolve TUDO. Envolve tudo isso misturado. Ou seja, tende a ser... absolutista, complicado e pesado. E muitas vezes uma pessoa vê-se embrulhada no meio de tanta hipocrisia, politiquice e problemáticas das mais profanas e corriqueiras que chega um momento em que se pergunta: o que raios faço aqui?! Passado um tempo, de questionamento e duvidas, muitas vezes a resposta a si mesmo é negativa: não acredito nisto; não quero isto; perco o meu precioso tempo. Muitos sentem-se enganados, traidos. E isso gera revolta. E voltam-se contra aquilo que antes tanto amaram e apoiaram. Há uma especie de periodo de nojo, em que se renega tudo, uma especie de vómito de algo estragado e ou mal digerido. As vezes esse vómito deixa uma azia continua, para o resto da vida, como um veneno que ainda está lá.Enfim, como em todas a organizaçoes, há os satisfeitos, mais ou menso satisfeitos, pro mais ou menos tempo, e há os outros. Neste caso, das organizaçoes "espirituais", como envolve um grau elevado de idealismo, em geral tudo se mantém mas sou menso bem se a pessoas ACREDITA. E se as contas sao pagas, claro...

Voltando ao assunto, o Vince, foi precisamente isso que se passou com este micro heroí desta micro história. Ele deixou de acreditar e está em periodo de nojo em relaçao à ISKCON. O fumar entra aí. Não consegue admitir comer carne de vaca (“the cow is my mother”), ainda tem bem presente os ensinamentos mais ou menos tradicionais que lhe inculcaram desde pequeno na seita, está consciente que como professor de yoga está em prevaricaçao (ou seja, vai ensinar o que não faz, como por exemplo não fumar, etc), mas não está muito preocupado. Assume as suas contradiçoes e hipocrisias. Até declara abertamente que só vai dar classes de yoga em Espanha para ganhar dinheiro, o que me fez perceber que não conhece bem a mentalidade dos ocidentais e espanhóies, que não estao preparados para tanto sentido pratico nestas questoes. Mas a mim esta atitude caiu-me muiiittto bem. Afinal, conheço muitos professores de yoga que também não não fazem o que ensinam, mas não têm coragem de admitir, alguns nem para si mesmos. Conheço tantos yogins que andam por aí a querer guiar os demais apesar de estarem tao perfeitamente perdidos como os que pretendem guiar. Pelo menos o Vince esta a começar bem, com Satya, com Verdade para consigo mesmo. E isso é a base de tudo. Actualmente a sua filosofia de Vida é mais ou menos esta: no gurus, no organizations. Just listen to your self, known yourself, trust yourself, make your one decisiones, be your self, right here right now. Your are responsable for your karma anyway... Embora eu não esteja a passar por nenhum periodo de nojo, pois o meu relacionamento com gurus e organizaçoes “espirituais” tem sido em geral positivo, acho que compreendi bastante bem o Vince, porque em parte me identifico. O que ele estava a dizer pareceu-me menos pretensioso, mais corajoso, verdadeiro, realista e importante do que mil e um discursos idealistas, alienados e até surreais que eu tenho ouvido de mil e um gurus um pouco por todo lado. É caso para dizer que afinal aprendeu alguma coisa com o seu ex grupo. Para quem quer aprender, até um pouco de veneno serve...



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terça-feira, 3 de março de 2009

Dia a dia em Rishikesh


O primeiro curso de Vedanta acabou há precisamente uma semana, no outro Domingo. E para o próximo faltam quase duas semanas. Inicialmente tinha previsto aproveitar este descanso de 3 semanas para viajar mais aqui na Índia, a algum sitio no Himalayas, ou lá perto. Tinha pensado em ir a Dharmashala, onde vivem os tibetanos refugiados do Tibete, nomeadamente o Dalai Lama, que fica ainda mais a norte, não muito longe daqui, faz-se a viagem em menos de um dia. Mas entretanto apeteceu-me mais ficar por aqui mesmo, a praticar, a estudar, estável, que está-me a saber bem. A Índia é muito grande. Tem quase tanta coisa para ver como a Europa inteira, é um sub-continente. Por isso não daria nunca para ver tudo. Prefiro ver agora um pouco e assentar a aprender algo a sério aqui. Outra vez verei um pouco mais.

Está-se particularmente bem aqui em Rishikesh, que é pequeno e bastante ao norte. Está a aquecer, mas está seco, o que ajuda. Não vale a pena trazer casacos para cá. Basta uma camisola mais quente, para a madrugada ou alguma noite mais ventosa. Está parecido ao Verao português. Só que o Verao a sério aqui é muito mais quente, e ao mesmo tempo chove. Chove muito, é a epoca das chuvas. Não quero cá vir me Maio ou Junho. Além do calor intenso tornar tudo mais desconfortável, dizem que, junto com a humidade, cria um ambiente propicio a criar todo tipo de virus e bactérias, e por isso também aumenta o perigo de contrair doenças variadas... Como sou calorento já estou a achar quente demais, mas ainda está bastante confortável. Dá até para tomar uns banhos nas praias do Ganga, o que os hindus consideram bastante auspicioso. Só que a água é gelada, não é muito limpa, e ainda por cima não é muito comum ver gente despida nas ruas, mesmo homens, embora homens em tronco nu a tomar banho no rio não seja mal visto. Mas ainda não me estreiei. Amanha vou a umas cachoeiras uns Km rio acima e talvez me aventure por lá...

Entretanto tenho praticado muito. Duas vezes por dia. Uma vez faço eu mesmo a minha pratica, outra vou a algum lado fazer com algum professor. Tenho feito umas praticas bastante intensas e começo a sentir o meu corpo a ganhar vida outra vez. Ás vezes também fico bastante cansado. 3 horas por dia de pratica, em média, mais quase outras tantas a caminhar, cansa. Quando não pratico passeio, vou visitar outro ashram, ou algum tempo, ou leio, ou fico na conversa com alguém. De qualquer forma aqui não acontece absolutamente nada depois das 10 da noite. Aliás, é bastante normal já estar tudo nos quartos, e talvez a dormir, por essa hora. E não há TV! Por isso também se acorda cedo. Ás 4horas da manha (!!!) o ashram ao lado toca para acordar para o primeiro pujá do dia, ás 4h30! Neste ashram o primeiro é as 5h. Não dá para não acordar. Eu tento voltar a dormir e volto a acordar por volta das 6.30, 7...

Aqui no ashram está tudo calmo. A maioria dos cerca das 250 pessoas que estiveram no primeiro curso foi-se embora, a fazer as suas vidas. Outros foram viajar. E outros, como eu, cá estao, a espera do curso seguinte, ainda a praticar e estudar, mas num ritmo mais tranquilo e autonomo.

Descobri que a comida no ashram, quando não está a haver nenhum curso e há menos gente, passa de ser monotona a ser...sempre igual! Já não tomo o pequeno almoço aqui há mais de uma semana. Prefiro comprar sumos e fruta e comê-lo no quarto. No refeitório não servem fruta nehuma, pois é (mais) cara. Só arroz, um guisado à base de batata com lentilhas ou ervilhas, chapata (pao espalmado tipo panqueca) e um caldo picante. Todos os dias. Entre refeiçoes há chai (chá indiano, ou seja, chá com leite). De vez em quando almoço ou janto fora. Por dois euros aqui come-se muito bem num dos muitos restaurantes dirigidos a turistas. Entretanto está a ocorrer um curso de yoga de 2 semanas aqui no ashram, pago e bem pago (cerca de 1500 euros por 2 semanas) no qual estao presentes uns 40 ou 50 europeus, americanos e asiáticos. Embora seja no ashram não é bem uma actividade do ashram, é apenas um curso nas instalaçoes do ashram no qual algum swami dá uma aulita de sanscrito e vedanta. Já tinha reparado que num curso de yoga que houve antes do meu primeiro curso de vedanta que para os praticantes estrangeiros de Hatha yoga (leia-se “yoga essencialmente á base de técnicas corporais”) eles até separam e diferencias as refeiçoes, com o cardápio a ser mais diversificado, rico e nutritivo. Realmente só mesmo um monje renunciante é que é capaz de achar satisfatório viver com aquela raçao diária tao monotona, com tanto hidrato de carbono e com pouco de tudo o resto. Ou entao sou eu que estou mal habituado. Ou bem...

Por cá está tudo bem. Óptimo mesmo. Ás vezes fico com saudades, mas em breve já estou aí outra vez. Ainda mal passou um mês desde que cheguei e parece muito, muito mais.

A minha mae mandou-me uma frase do Miguel Torga bem bonita: “
«transpor as fronteiras uma a uma é morrer sem nenhuma»”. Viajar é bom.
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Templo a Nihilkanta – o Shiva “garganta azul”, e um fetiche ecologico


Aproveitando a ida de um grupo de brasileiros que conheci ao dito templo, tomei boleia. Boleia a...pé! 8 Km a maior parte a subir a montanha ingreme até descer um pouco já do outro lado e finalmente encontrar o templo, numa pequena vilória de montanha. O templo é dedicado a Nihilkanta – o Shiva “garganta azul”. Quem quiser saber mais pode consultar a net (wikipedia) e lá lerá tudo e mais alguma coisa sobre os mitos referentes a este aspecto de Shiva.

Nós fomos a pé, mas dava para ir de carro ou mota, por trás, contornando a montanha. Mas assim é mais bonito, e pode-se contemplar o rio e Rishikesh toda de cima. Mas sao cerca de 4 horas, sempre a subir! E nós, por ideia do guia dos brasileiros, pusemos em pratica a brilhante ideia de fazer um pouco de limpeza na montanha. Levamos sacos grandes e enchemo-los de plásticos que encontramos pelo caminho. Escusado está de dizer que não limpamos nem 1% do lixo que havia no caminho, que é muuuiitttooo, como em todas as partes da Índia. Mas nao deixa de ser uma acçao bonita, conscienciosa. E cansativa, muito cansativa. O pior era quando passavamos pelos indianos que nos olhavam pasmados. Não entendiam. Nem mesmo quando perguntavam e explicavamos que estavamos a limpar a montanha. Não entendiam. Está fora do alcance deles. Aqui não há caixotes de lixo, manda-se tudo para o chao. Mesmo que a montanha, ribeiro ou rio sejam sagrados. Aliás, parece-me que o raciocinio deles é ao contrário: se é sagrado façamos o que façamos não podemos nunca sujar, porque é em si mesmo puro. E portanto mandam lixo para o lado, para o chao, para o ribeiro que passa, mesmo que seja o mesmo ribeiro onde vao buscar agua para fazer o chá e cozinhar!

O mais ridiculo é que alguns burocratas lembraram-se de considerar esta parte da montanha e sua floresta uma reserva protegida. Logo expulsaram os poucos sadhus (os renunciantes, yogis) que ali viviam em grutas, em alguns casos há décadas, numa tradiçao que terá talvez milénios. Mas não podia ser... No entanto permitem barraquinhas de comes e bebes monte acima, para vender coisas aos peregrinos. E essas barraquinhas sao nojentas e contribuem para sujar mais toda a area. Enfim, coisas que nem os deuses indianos podem explicar e resolver. Se é que há alguma coisa a ser percebida e resolvida! É o que é.


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O Sadhu que viveu 40 anos numa gruta!

Na Índia os gurus (professores e ou mestres) tendem a ser reverenciados. Boa parte dos gurus sao swamis, monges renunciantes, que só por sê-lo tendem a ser considerados homens santos, a quem se respeita, porque sao homens que deixaram tudo o demais para se dedicarem apenas e só a buscar o conhecimento de si mesmos. Destes, alguns swamis, sadhus, sao considerados iluminados. Não há nenhum medidor de iluminaçao objectivo. Como é obvio é tudo bastante subjectivo. Mas alguns destacam-se, ganham fama, sao procurados para ensinarem, aconselharem, etc. O mais comum é que sejam cumprimentados com uma reverencia que consiste em ajoelhar-se, tocar os pés, eventualmente até beijá-los, e cumprimentar com as maos juntas a frente do peito com um namaskara (saudaçao, tipo “bom dia”, ou “bom dia excelentissimo guru”, algo do genero...), mostrando admiraçao, respeito, carinho, submisao, humildade, etc. Para um indiano isso é muito natural. Tao natural que fazem-no com a facilidade com que nós damos um aperto de mao. Mas para ocidental fica menos natural. Especialmente em tempos em que se valoriza tanto o individualismo, o orgulho, a vaidade, o ego. Para mim não é natural e por isso não ccumprimento assim ninguém. Mas na passada terça feira fui com um grupo que conheci conhecer um sadhu que viveu 40 anos numa gruta da montanha aqui em torno ao Ganga em Rishikesh. 40 anos numa gruta!!! O velhinho é magrote, tem cara humilde e ainda por cima estava preso a uma cadeira com uma perna partida. Não tem nenhum ashram, nem estrutura, nem gente a segui-lo e apoiá-lo. De repente, a este tipo até pareceu normal fazer o tradicional cumprimento de tocar os pés...

Chegamos e sentamo-nos a volta dele. Ele estava pronto a responder a qualquer coisa que lhe pedissemos. E o primeiro que quisemos saber foi a história dele...Depois de atender o telemóvel lá nos começou a contar e responder. Sim os sadhus, supostamente renunciaram ao mundo mas a maioria tem telemóvel! Adiante...

Lá ficamos a saber como desde pequeno teve inquietaçoes religiosas, filosóficas, espirituais. A certa altura decidiu abandonar tudo para procurar as respostas ás questoes existenciais que tanto o perseguiam. Essa busca trouxe-o a Rishikesh. Aqui acabou por encontrar um guru que vivia numa montanha e que acabou por se tornar o seu guru. E lá ficou a viver, na mesma gruta. 40 anos! Chegou por volta de 1960, quando Rishikesh já era relativamente famosa pelos yogis e sadhus que a frequentavam e que por aqui viviam. Mas em 1960 ainda quase não havia estradas, nem pontes, nem ashrams. Turistas e mesmo peregrinos indianos eram pouquissímos. Logo não havia hoteis, lojas, etc. Isso só começou 10 e 20 anos depois. Os poucos sadhus e yogis que cá viviam em geral acolhiam-se em grutas ou kutirs (tipo palhotas), ou ao pé do rio, ou algures mais acima já na floresta da montanha. Ainda havia tigres nessa florestas, e ás vezes apareciam no rio para beber agua... Imagine-se o cenário! Entretanto o mundo mudou. Rishikesh mudou. Há várias pontes e barragens norte e sul de Rishikesh. E, absurdo, algum burocráta resolveu declarar que a floresta à volta de Rishikesh, nas montanhas que a cercam, deveria ser declarada reserva protegida. Até aí tudo bem, pois essa floresta está mesmo a desaparecer, e a ser invadida por construçoes ilegais e lixo de vendedores ambulates, etc. Mas alguém tem feito alguma coisa para limpar a montanha, ou pelo menos impedir que fique mais suja? Não. Mas tiveram abrilhante ideia de expulsar todos os sadhus que ali viviam! Em alguns casos viviam ali há decadas. Em alguns casos em grutas habitadas por yogis há séculos! Que grande mal é que estes yogis faziam a montanha? Nenhum. Mas foram expulsos. Um deles foi este velhinho que fomos conhecer. Por sorte dele um hotel junto ao rio acolheu-o. Ele vive lá. E é lá que recebe as suas visitas, de yogis e ou turistas como eu que lá vao para perguntar-lhe coisas sobre o yôga, ou sobre a Vida, sobre Deus ou sobre qualquer coisa. E foi o que o nosso grupo fez. E, claro, no fim deixamos o dakshina (básicamente, o pagamento).

Aqui deixo algumas frases que escutei e gravei...

(atençao que o contexto cultural é outro, e por isso as mesmas palavras não têm necessáriamente o mesmo significado)

Palavras de Swami Shankar Das, um yogi que viveu 40 anos numa gruta!

“Deus é como um espelho: quando nos colocamos diante de Deus vêmo-nos a nós mesmos!”

“Deus conhece todos os nossos pensamentos, e todas as linguagens, e todas sao dispensáveis para comunicar com Deus. Qualquer comunicaçao é entendida por Deus, porque é sempre Deus a falar consigo mesmo.”

“Antes (de ser iluminado) via Deus fora de mim, fora das pessoas. Agora vejo Deus em todas as pessoas. Tudo e todos estao conectados.”

“Yoga é aquele que é capaz de juntar aquilo que parece separado.”

“Yoga significa que ambos somos o mesmo.”

“Ás vezes o yogin vai praticar mas com a motivaçao errada. Quer alcançar um corpo muito bom, ficar cheio de energia, mais concentrado e inteligente, etc. Ás vezes obtém tudo isso. Ou pelo menos convence-se disso. Mas como isso vem do ego e é para o ego, como a atitude é o égoísmo, o yogin não obtém exito (iluminaçao).”

P: É fácil estar estável e "bem" aqui, em Rishikesh, de férias, a praticar yoga, sem pressoes. Mas e como manter este estado numa grande cidade, sob o stress do trabalho, com a poluiçao, etc? "R: Vai para onde for necessário, pratica yoga, estuda e ilumina-se. Entao nao importa onde se vive..."

P: Para quê continuar, qual a sua motivaçao de viver se já encontro Deus que era a meta que tinha na Vida? R: “Ainda tenho desejos. Tenho o desejo de viver mais anos.”

“ Quando o yogi pensa que já se iluminou e não precisa de mais ninguém, que não precisa de mais gurus, que não precisa aprender mais, entao pára. Pára de conhecer. Mas o yoga nunca acaba, nunca deixamos de aprender, mesmo “iluminados””.

“A vida pode ser dificil para quem não a entende, mas é divertida se a conhecemos. É como um drama, um teatro, um filme. E é bom ter papel nesse teatro, mesmo que pequeno.”

Não é preciso ir viver para uma gruta para chegar a esta filosofia de Vida, mas para ele funcionou...







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Festividades: Shivaratri

Ontem à tarde participei de uma celebração muito especial aqui em no templo do ashram em Rishikesh. Foi a celebração do MahaShivaratri, uma das principais datas religiosas para os hindus. Neste caso numa segunda feira, pela primeira vez em muitos anos. A segunda-feira é dedicada à lua, e por essa razão é o dia que se relaciona ao deus Shiva. A data foi considerada pelos indianos como especialmente auspiciosa. Desde as 4.30 da manha que havia devotos (e curiosos como eu) a manter o mantra principal: “Om namah shivaya”. Mais tarde seguiu-se o ritual própriamente dito com muitos cantos védicos e o puja do lingam com leite de coco, frutas, etc, na camara interna do templo. Nas ruas via-se mais gente que de costume. Especialmente mais indianos. Muita gente tomou banho no Ganga, alguns logo as 4.30 da manha, uma hora considerada especialmente propicia, pois é a hora do Brahmamurti, onde tudo é mais sereno. Embora seja uma festividade marcadamente religiosa, para alguém como eu que procura conhecer mais da cultura hindu e do ambiente em que essa cultura acontece, foi um momento especial. Até proque estes rituais, embora longos, tendem a ser bastante animados devido aos mantras. Até o Swami Dayananda participou alegremente, fosse puxando os mantras, fosse tocando o seu tamborzinho... Isso tudo pelo meio de entrevista para a TV, entrevistas pessoais a devotos, discipulos e alunos que o requisitavam, etc.

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domingo, 22 de fevereiro de 2009

Ajuda a nevegaçao 3

Outra vez...

Tenho estado pouco tempo na internet. Mas escrevo sempre o meu diario de viagem. Assim, que vou publicar menos vezes, mas talvez aos magotes!

Podem ler tudo fazendo scroll na pagina, ou simplesmente aproveitar estes links para clicar e ler na ordem cronologica. Depois basta carregar em "pagina inicial" (ou "home"), no fundo do articulo-pagina, e voltar a pagina inicial.

Rishikesh, os yôgas...

A vida de ashram...

Coisas da Índia: conduzir a apitar


(Ignorem essa coisa que aparece sempre no fim de todos os textos a dizer "Leia o artigo completo CLIC". Essa funcionalidade nao esta a funcionar...)
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Coisas da Índia: conduzir e apitar!


O conceito de higiene, limpeza e poluiçao que temos na Europa não se aplica na Índia. Aqui tudo éende a ser muito mais poluido e sujo. O lixo nas ruas nem em Napoles seria concebivel! Junto ao mau funcionamento do saneamento (se é que existe) pode criar cheiros abjectos nas ruas. A poluiçao visual também é grande, com mil e um anuncios, de todo tipo de coisas, tudo bastante colorido e com pouco cuidado no design. Mas, para mim, a poluiçao que me fere mais, e fere muito, é a poluiçao sonora. Na Índia, como na maioria do países do médio oriente, buzina-se muito! Mmmuuiiiitttttooooo!

Na Europa considera-se falta de educaçao buzinar. Considera-se que quanto menos som produzimos melhor, mais bem educados (excepto música, claro). Na Europa só se buzina para sinalizar uma situaçao limite, perigosa. E se o buzinar é intenso, prolongado ou repetido o mais provavel é que o condutor esteja muito vermelho, zangado, stressado, e prestes a sair do veículo e dissolver o stress com uma bela discussao, que pode chegar a vias de facto! Aqui não. Aqui buzinar é comunicar. É falar. É dizer, estou aqui. Só isso. Eles buzinam muito, mas nem chegam a stressar por isso. Simplesmente continuam nas suas meditaçoes ou conversas, conduzindo caminho adiante. E é bastante normal que um a moto ou rickshaw se adentre por qualquer rua ou recanto, as 4 ou 5 da manha, com aquele barulho infernal que eles fazem so por estar a trabalhar, e ainda apite. Por está lá, existe.

Não há passeios. Os peoes andam na estrada. Na melhor das hipoteses na beira da estrada. Até se for a “auto-estrada”! Aliás, não sao só as pessoas. Também as vacas, caes, macacos, porcos, cabras, bufalos, burros, elefantes se houver... Na Europa os peoes têm prioridade. Aqui ter mota é motivo de orgulho. Por isso não importa se a ponte é estreita e essencialmente pedonal. A motoreta passa a apitar o caminho inteiro. Dói nos ouvidos. Mas para eles é normal! Os carros e rickshaws, assim como autocarros e camioes, não fazem por menos. Em geral vao no meio da estrada. Quando vem outro carro no sentido contrario ambos apontam para o centro, e no ultimo instante ambos se desviam cada um para o seu lado! E sempre a apitar. Não zangados, só a falar, “estou aqui, aqui vou, estou aqui, aqui vou....”.

Como tudo o demais ás vezes cansa. Tanta poluiçao, tanta falta de civismo, para os nossos padroes. Dói até. Mas também tem piada. E, sempre, vale mais rir que chorar. E já estava bastante farto de viajar pelo mesmismo da Europa. Estou contente.
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Vida de ashram

A traduçao mais facil e comum de ashram é mosteiro. Um local onde vivem e confluem pessoas dedicadas a aprender e ensinar o conhecimento, neste caso o sanscrito, o yoga , o vedanta, os vedas.

Na pratica um ashram costuma ser algo entre um mosteiro e um hotel, e ás vezes é mesmo as duas coisas. O ahram onde estou é basicamente uma instituiçao de ensino, e parece uma especie de campus universitário, embora mais pequeno e ao estilo indiano, ou seja, menos bonito, menos espaçoso, menos bem projectado, menos sofisticado. Mas ainda assim funcional. Os ashrams maiores e mais reputados fazem trabalho social e em alguns casos incluem escola, orfanato, hospital de leprosos ou outra coisa do genero. Não necessariamente esta tudo no mesmo perimetro, até porque o normal é ir crescendo, aos poucos, a medida que surgem fundos, nomeadamente donativos mais generosos que alguns devotos fazem. A maioria tem cantina, ou eventualmente ate restaurante comercial, aberto a qualquer pessoa que pague. Não tenda a imaginar uma igreja enorme com uma ampla estalagem anexa, como costumam ser os mosteiros cristaos. Tudo é mais recente, menos artistico, menos monumental, menos sólido. É tudo mais pratico e funcional, mais modesto, com pouca sofisticaçao, gosto e decoraçao. Outro factor a notar é que neste ashram onde estou, por exemplo, o templo onde se efectuam os rituais religiosos é o edificio mais pequeno de todos. Aliás, tenho reparado que os hindus, embora muito dados a cores garridas e um monte de pirosices, e embora sejam bastante religiosos, não tendem a construir templos muito grandes, pesados e monumentais. Têm é muitos. E os mosteiros é mais ou menos igual. Se você quiser considerar a sua cabana um mosteiro também pode ser. Aliás, a maioria destes ashrams começou dessa forma. Um swami (monge) ganha reputaçao, começa a ter apoios e aos poucos deixa de viver numa gruta ou cabana e começa a construir instalaçoes mais sólidas, que aos poucos vao crescendo. Este ashram onde estou foi mais um dos que começou assim. O monge principal vivia, como muitos outros, num kutir, ou seja, uma cabana, tipo pallhota, aqui mesmo junto ao rio. Mas ganhou fama e apoios, e aos poucos foi construindo um ashram.

O ashram onde estou é enorme. É o Swami Dayananda Ashram de Rishikesh, um dos mais antigos e bem considerados, sobretudo por indianos. Porque aqui o ensinamento ainda é mais tradicional, com muito sanscrito e vedanta. Dos pouco mais de 250 presentes neste primeiro curso, uns 200 sao indianos, a maioria gente mais ou menos endinheirada e de casta alta, e também bastantes swamis visitantes, que aqui estao como eu ou os demais, para aprender da boca do mestre. Alguns já vêm ouvir pela énesima vez. A média de idades deve ser os 50 anos. Talvez mais. A principal lingua falada é o inglês, que serve de lingua franca para todos. Alguns vêm para aprender filosofia, outros para aprender religiao e aprofundar-se na cultura, conhecimentos e rituais tradicionais do hinduismo. Aqui isso está tudo incluído e mais ou menos junto, e cabe a cada um saber pescar só aquilo que quer. Nada é imposto, e não há sectarismo religioso algum. Aliás, os conceitos de religiao e deus de um hindu sao um pouco diferentes dos nosso ocidentais. Por isso o swami ate evita falar de espiritualidade, deus ou religiao, porque sabe que essas palavras tendem a gerar mais equivocos qu eentendimento. Mas também não se pense que, apesar do nivel cultural e economico ser alto (muitos professores, alguns médicos, e tal), e do ensinamento ser essencialmente filosófico, na verdade humanidade é...humanidade. E há muita gente, principalmente indianos, que vêm aqui por questoes puramente religiosas, por crença, para rezar, para cumprir com obrigaçoes rituais e tradicionais, para fazer boa acçao e acumular bom karma, para tentar entender e resolver algum dos seus probleas e sofrimentos, e quiça o swami tenha alguma receita mágica para resolver tudo...

As instalaçaoes deste ashram contêm cerca de 150 quartos, uns de 2 outros de 3 pessoas, com capacidade para cerca de 300 pessoas. Sem luxos, mas um conforto razoavel (para a Índia e para um mosteiro). Além das habitaçoes o mosteiro tem as cantinas, recepçao, templo, livraria e biblioteca, e três salas de estudo, conferencia e ou pratica.

A cantina é exemplar do que é a vida comunitária no ashram. É grande, com várias salas que acessam umas ás outras. Mas tem só algumas poucas mesas de plastico, que se pressupoe estarem ali para as pessoas mais velhas ou com algum problema fisico. A maioria das pessoas come sentada no chao, sobre um fino tapete, de pernas cruzadas, lado a lado com os demais. Come-se num tabuleiro de metal, e bebe-se num copo de metal. Pode-se comer com a mao ou com ajuda de uma colher. Sempre com a mao direita, que os hindus consideram a limpa. Eu ainda não consegui comer à mao... A comida é servida (a horas fixas) directamente das panelas. Servida por voluntarios de entre os participantes no curso aos demais participantes, que vao em fila passando e sendo abastecidos. Não há escolha. Só se pode pedir um pouco mais ou menos, mas a comida é igual para todos. Geralmente é arroz, alguma coisa com batata, algum outro vegetal (ervilhas, por exemplo), um molho qualquer dado a picante e pao. Pao quer dizer: algo parecido a crepe... As vezes tem algo doce, algo parecido a arroz doce, que até pode ser servido e comido junto ao resto! A comida nunca tem alho ou cebola, que sao considerados impuros, sexualmente estimulantes, “rajasicos”, ou seja, criadores de movimento, instabilidade. A comida, embora básica, nem é má. Eu gosto. O problema está em que é assim quase todos os dias, quase igual, 3 x por dia (pequeno almoço incluído), 7 dias por semana! Para quem escolheu vida de monje renunciante e encarou a serio a possibilidade de uma vida errante, sem confortos, esta alimentaçao até deve superar as expectativas. Mas para alguém habituado a uma vida mndana, que está sempre a variar e diversificar, e que come o que quer quando quer isto exige uma certa habituaçao... De qualquer forma também não é nenhum grande sacrificio, e quem quer pode sair e ir comer fora. Depois de comer cada um vai lavar o seu copo e tabuleiro aos lavadores exteriores ao comedor e deposita-os já limpos no respectivo local. Ou seja, não há luxo nenhum, apenas sentido pratico. E se para um ocidental isto pode pecar por alguma falta de conforto e sofisticaçao no serviço ou instalaçoes, para os hindus, muitos deles de casta alta e e bom poder económico, é muito mais siginficativo que tenham de servir a comida e limpar o próprio prato. Não o fariam em casa, mas aqui, para eles, é ritual, é um acto de contricçao e humildade, é uma pequena rendiçao, acumulam bom karma...

Também se espera que cada um tome conta da própria habitaçao, (que em geral é partilhada), nomeadamente no que a limpeza diz respeito. Não há serviço de quarto! Nem sequer lençois! Só o básico: cama, cobertor, luz, W.C....Na realidade as instalaçoes sao muito boas para o padrao de um hotel indiano isto seria quase de 2 ou 3 estrelas. Já não me lembro da ultima vez que lavei roupa a mao! Até há serviço (pago, mas barato) de lavandaria, mas usam agua que talvez seja a do rio, ou pior, sabao pouco, e lavam e secam a roupa a paulada. As vezes vem rota. Mais vale lavar no quarto...

A esta altura é importante dizer algo: tudo isto é gratuito! Os cursos e demais actividades, a estadia no quarto, as refeiçoes... não é pouco. Claro que se pode (e deve) contribuir voluntariamente com algo. Tipo 10 euros (500 a 600 rupias) por dia é uma soma bastante agradável nestas partes, e bastante acessivel para um ocidental. Quer quer dá mais, e há quem dê, e há quem não dê nada... Geralmente à hora da refeiçao menciona-se o nome de alguns patrocinadores mais generosos, quase sempre indianos hindus, para quem tudo isto é tradiçao, religiao e ritual.

O regime não é militar. Está tudo bem organizado, mas nada é imposto. Posso sair quando quiser e só vou as aulas que quiser. Mas vim com o propósito de aprender algo e por isso estou a seguir o curso quase integralmente, neste caso o Camp 1- Vedanta didinmah (“isto proclama o Vedanta”), que dura cerca de 10 dias, 3 aulas de uma hora por dia. Para além disso posso ir a meditaçao guiada as 7. 00, estudar sanscrito de manha e a tarde, e até ir a classe matinal de Hatha yôga (muito suave e terapeutico), ou a classe de musica, e ainda frequentar o sat sanga nocturno (20.30), onde se vocalizam mantras em grupo, e o swami responde a perguntas que qualquer um pode fazer. Para quem quer ainda há os pujas feitos no templo. Não faço tudo. Embora esteja já entrar na rotina do ashram seria demais para mim. Até porque as aulas de Vedanta, só por si, sao bastante intensas, e convem ter algum tempo para reflectir e meditar sobre o assunto. De dois em dois dias, à tarde, saio e vou fazer uma aula de Hatha yôga às 17. 00 com um professor que conheci e estou a gostar bastante. Sao duas horas intensas, da qual (ainda) estou a sair compeltamente esgotado. Também faço a minha própria pratica de yôga todos os dias, uns 45 minutos. E tento ir a meditaçao matinal e aos sat sangas nocturnos que sao bastante bons. As vezes saio com mais alguém no pouco tempo livre que sobra, seja para ir comer fora ou comprar alguma coisa necessária. Ou só para distrair um pouco! Quem quiser pode começar às 4 30 da manha com o primeiro puja no templo, e só acabar às 22 00, depois do sat sanga, quase sem pausas, a nao ser uma pequena depois do almoço, que a maioria aproveita para uma curta sesta.

Os horarios durante este Camp sao assim:

  • 4.30 – puja no templo

  • 7.00 – meditaçao

  • 8.00 - pequeno almoço

  • 9.00 - vedanta dindimah (classe de vedanta)

  • 10.00- yoga, sanscrito, ou musica vedica

  • 11.30- vedanta dindimah (classe de vedanta)

  • 12.30- almoço

  • 16.00- sanscrito, ou musica vedica

  • 17.00- vedanta dindimah (classe de vedanta)

  • 18.30- puja no templo

  • 19.30 – jantar

  • 20.30 – sat sanga

Dentre dos cerca de 70 estrangeiros (media de idades deve ser 35 anos) presentes há-os dos 4 cantos do mundo. Bastantes japoneses,sempre super compenetrados, bastantes brasileiros, portugueses somos 3, australianos há bastantes, embora seja uma comitiva que parece ter caido aqui de paraquedas e estar meio perdida. Acho que a maioria esperava outro tipo de Yôga, mais Hatha Yôga. Mas aqui o Hatha yôga (o yôga mais pratico, mais fisico digamos assim) é considerado meramente um meio, um meio para dar limpeza, saúde, força, vitalidade e disciplina ao corpo e mente, de forma a poder pensar e meditar melhor, de forma a consagrar melhor todos os recursos à cultura, ao estudo, ao conhecimento, ao jñana, ao vedanta... Imagino que vir de um yoga de ginásio directamente para aqui deve ser, no minimo, um choque. Provavelmente uma desilusao. Enquanto para muitos (inclusive para mim) isto é o culminar do ensino do yôga, para outros, vê-se na cara, perguntam-se: o que raios faço eu aqui?

Outra coisa que se pressupoe, e que alguns ocidentais têm dificuldade de entender e respeitar, é que isto é um mosteiro. Um sitio dedicado ao ensino. Um sitio que foi construido por e para Swamis (monjes) celibatários, que resolveram dedicar toda a sua Vida a meditar, a aprender e ensinar o conhecimento vedico, nomeadamente o sanscrito, vedanta e o yoga, e que renunciaram a tudo o demais. Monjes celibatários! Ora, se até para um indiano comum, numa rua comum, ver uma mulher loira e de roupas justas (se mostrar os ombros e as pernas pior. Ou melhor, nem sei) já causa quase o mesmo efeito que na Europa causariam mulheres nuas em praias que não sao de nudistas, imagine-se dentro de um ashram! Aqui pressupoe-se que ninguem vem para desfrutar de uma vida “social”. Assim, e embora o ambiente seja bastante agradável e relaxado, espera-se que as roupas evitem grandes decotes e sejam folgadas, ou pelo menos não evidenciem as formas. Talvez por condicionamento cultural há muita gente vestida de branco, principalmente ocidentais, que tendem ás vezes a ficar mais indianos que os próprios indianos. Até porque os indianos tendem a vestir-se cada vez mais como ocidentais! Mas a verdade é que as roupas tradicionais, nomeadamente os pijamas, sao bonitos e confortáveis. Pelo menos parecem, porque ainda não me converti! Cai bem, ou seja, demonstra respeito, se os cabelos estiverem apanhados, e convem não abusar de perfumes. Abraços, beijos e maos dadas entre homens e mulheres...nao. Nem aqui nem em qualquer local publico indiano. Na india tradicional isso não existe, nem o nosso namoro... Depois de olhares discretos passa-se directo ao casamento! A maioria das mulheres ocidentais sao consideradas...liberais, fáceis, ou até prostitutas! E não sei se eles gostam ou não, acredito que tenham um pouco de inveja nossa. Mas aqui no ashram não. Ninguém recrimina ninguém, já estao habituados a ocidentais, mas espera-se um pouco de pudor. E não custa, é uma questao de respeito.

Enfim, apesar do programa intenso e das demais condicionantes, isto era exactamente o que vinha a procura. Está a superar as minhas expectativas todas, nomeadamente a nivel de qualidade do ensino, e por isso estou contente.

Depois conto mais, sobre os swamis (monjes) e sobre o que mais houver a contar...



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